Aline Bordalo é uma jornalista de destaque, autora do livro “Maurício 1989 – O Escolhido“, com uma trajetória marcada por iniciativas pioneiras no jornalismo esportivo. Com passagens pela Band e outros grandes veículos, ela se consolidou como uma voz importante na cobertura do futebol, especialmente com o foco nas histórias humanas por trás dos esportes. Criadora do canal Botafogo Nela no YouTube, com mais de 44 mil inscritos, Aline também se destaca como comentarista do programa “Elas em Campo” e defensora da presença feminina nos estádios, sendo uma figura central no fortalecimento de projetos como o “Hora Delas“, que visa tornar o Estádio Nilton Santos mais seguro e acolhedor para as mulheres.
Álvaro Tàllarico: Aline, você tem uma trajetória admirável como jornalista. Como a sua experiência na Band e a sua atuação em outras plataformas moldaram a sua visão sobre o jornalismo esportivo?
Aline Bordalo: Eu sempre gostei de fazer matéria de comportamento, contando histórias. Na Band eu sugeria pautas assim, cheguei a criar um quadro no programa do José Carlos Araujo chamado “Aline no país da bola”, onde eu entrevistava esposas de jogadores e atletas mulheres. Quando comecei meu canal, pude me dedicar exclusivamente a este tipo de jornalismo. Adoro ouvir histórias de torcedores, vou a todos os jogos sempre atenta a quem está à minha volta. Sempre descubro personagens incríveis. Hoje em dia o jornalismo esportivo está muito opinativo, a mídia independente cresceu (ainda bem!) e a maioria dos canais faz análises, corneta o time, os programas de TV também. Eu quis fazer algo diferente e consegui. O quadro onde entrevisto as esposas dos jogadores é um sucesso, tenho muito retorno da torcida, e através delas acabo conseguindo informações exclusivas que os jogadores jamais me dariam. Ter vivido de perto o futebol durante muitos anos me deu essa noção, me fez entender o que gosto realmente de fazer.
Álvaro Tàllarico: Você é autora do livro “Maurício 1989 – O Escolhido”. O que a motivou a escrever sobre esse tema e como você vê a importância de contar histórias que envolvem ícones do esporte?
Aline Bordalo: Meu sonho sempre foi escrever sobre o Botafogo. Quando veio a pandemia, eu estava fazendo uma live no meu canal com o Maurício e ele comentou que tinha esse projeto. Eu na mesma hora me ofereci para escrever, e no dia seguinte já estava debruçada sobre jornais antigos e assistindo a todos os jogos do Carioca de 89. Um botafoguense me procurou me oferecendo todas as edições do Jornal dos Sports daquele ano e isso me ajudou imensamente. Fui pegando os depoimentos por áudios do whattsapp e escrevi em tempo recorde, seis meses. O livro ficou lindo e o Maurício ganhou a homenagem merecida. Durante a pesquisa, fiquei sabendo de muitas histórias que ficaram esquecidas no tempo. Recuperei todas para que as novas gerações entendam a importância daquele título e valorizem nossos ídolos. Hoje o Carioca não tem mais aquele charme, mas na época era mais importante que o Brasileiro. Tudo isso eu explico.
No ano passado também escrevi um livro em tempo real, mas preferi publicá-lo apenas digitalmente, por tudo o que aconteceu. Mas essa história ainda não terminou. Quem sabe o final feliz venha esse ano?
Tàllarico: Seu canal no YouTube, Botafogo Nela, já possui mais de 44 mil inscritos. Quais são os principais temas que você aborda e como a interação com os torcedores influencia o seu conteúdo?
Aline Bordalo: Eu vou a todos os jogos no Rio e fico no meio da galera. Gosto de fazer o telespectador se sentir no estádio, porque a torcida do Botafogo é muito grande e está espalhada pelo mundo todo. Nos comentários, vejo depoimentos de botafoguenses que nunca estiveram no Rio agradecendo por terem se sentido no Niltão. Os torcedores são os protagonistas dos meus vídeos e das minhas reportagens, sempre. Também gosto de mostrar os bastidores de uma coletiva e lugares que só os jornalistas têm acesso, coisa que ninguém mostra.
Tàllarico: No programa “Elas em Campo”, você comenta sobre a presença feminina no esporte. Qual é a sua percepção sobre a evolução do espaço das mulheres no jornalismo esportivo nos últimos anos?
Aline Bordalo: Graças a Deus cresceu demais o número de mulheres no jornalismo esportivo. Quando comecei na Band, na década de 90, tive que ficar na editoria Rio, fazendo reportagens de cidade, porque ouvia a frase: aqui mulher não trabalha no esporte.
Só consegui uma oportunidade em Fortaleza, na TV Verdes Mares, afiliada da Globo. Lá não tinha preconceito algum! Eu apresentava o Globo Esporte local e fui a primeira mulher a atuar numa transmissão ao vivo de futebol. Cobri o Brasileirão e a Copa do Nordeste, foi incrível! Mas quando voltei pro Rio ainda tive que esperar sete anos até conseguir finalmente ser uma jornalista esportiva. Mas sinto que abri portas para outras mulheres que amam futebol e entendem muito do assunto. O programa Elas em Campo é outra iniciativa pioneira. É o único no rádio carioca que fala só de futebol feminino.
Tàllarico: O programa “Hora Delas” tem como objetivo tornar o Estádio Nilton Santos um espaço mais seguro e acolhedor para as mulheres. Como você vê a importância dessa iniciativa no contexto atual do esporte brasileiro?
Aline Bordalo: As torcedoras do Botafogo têm feito um trabalho incrível, apoiando quem sofre assédio no estádio e dando voz a este tipo de coisa, que pode acontecer em qualquer torcida. O grande diferencial é o clube ouvir e oferecer todas as ferramentas para que casos assim se tornem cada vez mais raros. O estádio Nilton Santos foi o primeiro no Rio a ter uma delegacia só para mulheres e o Botafogo está sempre atento a este tipo de iniciativa.
Sobre o patrocínio da SHEIN:
Tàllarico: O patrocínio da SHEIN fortalece o programa “Hora Delas”. O que você acredita que essa parceria pode trazer de positivo para a visibilidade e valorização da presença feminina no esporte?
Aline Bordalo: Fiquei muito feliz por saber que as marcas estão olhando pelo futebol feminino, já era tempo! Nesse aspecto, São Paulo está muito à frente do Rio, o campeonato Paulista conseguiu patrocínio da Petrobras, os estádios ficam cheios, há uma valorização muito maior. Acredito que o Botafogo, por ter um norte-americano no comando, esteja prestando mais atenção ao futebol feminino, já que nos Estados Unidos ele é até mais forte que o masculino. Que outras marcas possam se associar também, pois em 2027 teremos uma Copa do Mundo no Brasil e isso dará muita visibilidade.
Tàllarico: Como você acredita que programas como o “Hora Delas” podem influenciar outras iniciativas de inclusão e igualdade de gênero no esporte e na sociedade como um todo?
Aline Bordalo: O que é positivo merece ser copiado, principalmente quando a gente vê resultados práticos, que é o caso do Botafogo. Há quanto tempo a gente não ouve falar sobre um caso de assédio no Niltão? Sinal de que está funcionando.
Tàllarico: Qual tem sido a resposta do público ao programa “Hora Delas” e a iniciativas semelhantes? Você notou uma mudança no engajamento das mulheres em eventos esportivos?
Aline Bordalo: Hoje as botafoguenses vão muito mais à vontade pro estádio porque sabem que existe uma rede de apoio. A cada jogo o número de torcedoras só cresce.
Tàllarico: Quais são os seus planos futuros para o canal Botafogo Nela e para a sua carreira no jornalismo esportivo? Você tem alguma nova iniciativa em mente?
Aline Bordalo: O jornalista hoje para sobreviver tem que estar tocando mil projetos para conseguir se manter no mercado. Hoje sou assessora de imprensa, apresento o Sobretudo Podcast com meu marido, Alexandre Araujo, estou escrevendo outro livro, e tentando entrar no universo do cinema. Não é fácil. O meu canal é uma válvula de escape, não faço para ganhar dinheiro, pois para isso teria que postar dois vídeos por dia, todos os dias. O que mais desejo é vivenciar a conquista de um título e registrar a alegria do torcedor. O Rio de Janeiro vai parar pra essa comemoração e eu quero estar em todos os lugares, captando toda emoção.
Tàllarico: Que conselho você daria para mulheres que desejam seguir carreira no jornalismo esportivo ou se envolver mais ativamente nas discussões sobre inclusão no esporte?
Aline Bordalo: Que tenham força de vontade e certeza de que é realmente isso que desejam. A questão do preconceito melhorou muito, mas ainda acontece, infelizmente. Minha única advertência é a questão financeira. Viver do jornalismo hoje é muito difícil. Mas encontrando seu público, seu estilo, você pode se sentir realizada.
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